domingo, 30 de janeiro de 2011

Help Desk da depressão

Assim como muitos discípulos dessa igreja, iniciei minha carreira de bispa em uma famigerada central de suporte help desk. No caso, eu prestava suporte para usuários daquele conhecido provedor de Internet discada chamado .

Quem já trabalhou com suporte a clientes sabe uma das maiores verdades dessa paróquia: A educação do cliente é inversamente proporcional ao valor que ele paga pelos serviços. Lá no suporte eu atendia umas criaturas que pagavam R$ 9,90 pelo serviço de Internet. Preciso dizer mais alguma coisa?

Mas eu não quero começar falando dos clientes, quero começar dizendo como éramos tratados pela própria empresa. As ligações caiam incessantemente, de forma automática após um bip no ouvido, não havia a opção de não atender, muitas vezes não havia 10 segundos de descanso em uma ligação e outra. Tínhamos 15 minutos diários pra fazer um lanche, ir ao banheiro e beber água. É, só 15 minutos pra tudo isso dentro de 6 horas. Comer na mesa era proibido, e mesmo em minutos sem ligações, conversar com o colega do lado também era proibido.

Acontece que fazer essa pausa de 15 minutos não era tão simples quanto podia parecer. Havia, sei lá, 500 analistas de suportes confinados em baias, e pra que eles não decidissem ir ao banheiro todos juntos, nos colocavam como refém de uma “bandeira de pausa”, também conhecida entre os analistas como “VALE MIJÃO”.

Eram 1 ou 2 vales mijões para todos aqueles 500 analistas, tínhamos que fazer a mágica de conciliar os poucos segundos em que não estávamos em ligação com a sorte de encontrar um vale mijão disponível. Os vale mijões eram colocados no alto da baia, então era só levantar pra conseguir visualizá-los. Alguns dias era IMPOSSÍVEL conseguir um vale mijão no momento certo, pois muitas vezes eles só apareciam quando a gente estava no meio de uma ligação, e bom, se você desligasse na cara do cliente pra ir de encontro ao vale mijão, ficava à mercê de levar uma carcada do supervisor, pois parte das ligações eram monitoradas.

Outra coisa que acontecia com muita freqüência era ter programado a pausa no telefone, atravessar toda a central correndo pra pegar o vale mijão, mas: outra pessoa chegou na frente e pegou o vale mijão. A bexiga que agüente.

E assim os dias corriam no suporte .

Bem, eu atendi mais de uma vez pessoas que conectavam, mas não conseguiam navegar na internet, e qual era o problema? Elas simplesmente não haviam aberto o Internet Explorer. O discador abria o Internet Explorer automaticamente, e se por algum motivo isso não acontecesse, algumas pessoas simplesmente não sabiam o que fazer.

Sabem, o Internet Explorer? Aquele "E" azul e redondo que fica na área de trabalho? Ou “Aquela bola azul na área de trabalho”. Era assim que tínhamos que nos referir ao ícone do IE para que os protozoários o encontrassem.

Certa vez uma irmã atendeu uma senhora que queria instruções para enviar e-mail. A irmã explicava:

Analista: - No campo Assunto, preencha o assunto do e-mail.
Usuária: - ok, Já preenchi.

Analista: - Agora no campo PARA, preencha o e-mail do destinatário.
Usuária: - ok, to preenchendo. Agora tem o campo CC. CONTA CORRENTE!! PERAÍ QUE VOU BUSCAR O NÚMERO.

É SÉRIO, gente.

Outra vez um irmão atendeu um usuário que reclamava que pagava o pra poder usar Internet todo dia, e queria saber porque não funcionava no domingo.

Analista: - Mas o Sr. Pode utilizar qualquer dia, inclusive domingo.
Usuário: - E pq está aparecendo aqui “usuário e senha inválidos no domingo”? (a mensagem era usuário e senha inválidos no domínio).

E assim foi o começo da minha jornada até aqui.
Nessa época eu ainda não fazia faculdade, os caminhos estavam abertos. Hoje me pergunto, por quê, irmãos, com todos esses percalços, continuei?

Minha visão estava turva e eu não conseguia enxergar o perigo de continuar esse caminho. Hoje, muitos anos depois, vejo com clareza que tudo aquilo era um sinal dos céus para que eu escolhesse um caminho mais iluminado, mas eu não fui capaz de perceber.

Por isso hoje estou aqui, como fundadora dessa Igreja, na missão de tentar ajudar algumas almas que ainda tem salvação, e tentar oferecer um pouco de compreensão e conforto para aqueles que assim como eu, escolheram o caminho das trevas e temem pelo futuro de suas almas.

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